O projeto LIFE WolFlux, numa ação coordenada pela Rewilding Portugal e pela Rewilding Europe, em parceira com a European Safari Company, desenvolveu, este mês de Novembro, o primeiro treino de guias de natureza, com o objetivo de apostar no empreendedorismo local no Grande Vale do Côa e promover a operacionalização desta atividade de uma forma mais sustentável e que respeite e valorize o património natural envolvente.
Promoção local de oportunidades e conhecimento
Este programa de guias, que teve uma duração de quatro dias, visa dar apoio ao setor local de turismo baseado na natureza, procurando formar novos guias de natureza na região e dar-lhes a conhecer o conceito de rewilding e de como este pode ter um papel importante na sua oferta de experiências e na transmissão de conhecimentos para o público, assim como a emblemática espécie do lobo-ibérico, sabendo que a sua preservação e expansão precisa de ser acompanhada de guias de natureza aptos a lidar com a mesma e a saber respeitar o seu espaço e habitat quando estiver a operar no terreno.
Aukje van Gerven, gestora de turismo e treino de guias da Rewilding Europe, deu o pontapé de saída para esta iniciativa destacando os seus grandes objetivos e a missão a que se propõem este tipo de ações. “É importante que os guias locais sejam formados na área do turismo responsável e marcado por uma boa hospitalidade, para atualizar e modernizar o turismo de natureza e as empresas de turismo em áreas naturais. Além de aprimorar os serviços que esses guias podem oferecer aos seus hóspedes, o treino também os capacitará a atuar como embaixadores de rewilding”.
Um grupo dedicado a aproveitar a oportunidade
Depois de muitas dezenas de inscrições, foram selecionados os oito participantes desta primeira edição: Alcina Sousa, Ana Magalhães, Catarina Prata, Hugo Ribeiro, José Almeida, Ricardo Peres, Samuel Ribeiro e Sarah Pires. Um grupo que se mostrou desde logo muito entusiasmado e dedicado a esta oportunidade desde o primeiro dia, quando foram recebidos pela manhã na sede da Rewilding Portugal, na Quinta da Maúnça, na Guarda. Com uma introdução dada por Simon Collier (responsável pela formação, mentor do projeto Nature Tourism Development e consultor da Rewilding Europe), Pedro Prata (líder de equipa da Rewilding Portugal), Daniel Veríssimo (técnico de empreendedorismo da Rewilding Portugal) e Aukje van Gerven (membro da equipa ligada ao turismo da Rewilding Europe da European Safari Company), o grupo de participantes teve logo uma oportunidade de se introduzir, explicar a sua experiência e motivações para o curso, e de ter um primeiro pequeno desafio prático de como trabalhar em equipa, preparando em conjunto uma argumentação sobre um tema à escolha relacionado com turismo de natureza, para depois discutir de forma coletiva. Ainda antes do arranque oficial das atividades mais práticas do programa, houve oportunidade de, numa pequena caminhada pela propriedade, testar os binóculos que lhes foram entregues e de ter um almoço convívio com vários membros da equipa da Rewilding Portugal.
O grupo seguiu depois para a aldeia de Vilar Maior, no concelho do Sabugal, onde os participantes ficaram desde logo a conhecer as instalações onde iam ficar alojados e a fazer as refeições dos dois primeiros dias: a pequena unidade de alojamento desenvolvida pela Junta de Freguesia e ainda a Casa Villar Mayor, membro da Rede Côa Selvagem. Um dos grandes rostos deste treino foi Fernando Romão, já que o guia de natureza da Wildlife Portugal (também membro da Rede Côa Selvagem) foi escolhido como formador para as atividades deste treino.
A sessão da tarde começou exatamente com uma visita guiada de Fernando Romão ao Vale Carapito, propriedade gerida pela Rewilding Portugal naquela área, e em que os participantes tiveram o primeiro contacto com o que é ser um guia de natureza, com os principais desafios que podem surgir ao longo de uma visita e ainda com o trabalho prático da Rewilding Portugal no terreno. Um primeiro impacto importante e que foi depois debatido e avaliado em grupo ao final do dia, como forma de encerrar os trabalhos desse arranque da iniciativa.
No segundo dia, da parte da manhã, Patrícia Gil, especialista em lobo-ibérico do CIBIO, deu ao grupo uma formação especializada em comportamento da espécie, vários aspetos importantes a ter em conta em atividades de observação da mesma, e ainda como tornar este turismo de lobo sustentável e adaptado à sensibilidade própria do lobo ibérico e às suas características. Uma espécie fundamental e essencial nos ecossistemas nacionais e locais, que importa preservar, e que é por isso importantíssimo ter em conta quando se está a trabalhar em turismo de natureza perto dos seus habitats.
Durante a parte da tarde houve lugar a uma aplicação prática mais dedicada do que tinham vindo a aprender até então, em que para além de uma aula no exterior, o grupo teve de aplicar as técnicas de guia de natureza com que já tinha tido contacto, nomeadamente através de atividades de encenação, em que os restantes membros do grupo se tornavam em grupos de turistas desafiantes para que o guia escolhido pudesse direcioná-los da forma correta e aprender dessa forma a lidar com situações inesperadas que podem acontecer em vários tipos de cenário. Outro aspeto fundamental em que este dia se focou, foi também na transmissão de conhecimentos relacionados com turismo sustentável e com os princípios éticos que se devem aplicar a este tipo de atividade profissional, já que ser guia de natureza exige uma preparação especial e dedicada nesse campo, pois estes profissionais vão usar como pano de fundo um património natural riquíssimo e que é importante preservar e cuidar.
No terceiro dia, o grupo despediu-se de Vilar Maior, mas participou antes num webinar do Rewilding Training Tourism, dedicado a envolvimento com as comunidades locais, lecionado por Simon Collier e também com uma participação ativa de Fernando Romão que respondeu a várias perguntas sobre a sua atividade tanto aos participantes deste treino de turismo como aos restantes participantes do webinar via online, assim como de Daniel Veríssimo, técnico de empreendedorismo da Rewilding Portugal que respondeu a várias questões dos participantes acerca do dia-a-dia que implica a sua posição. Outra iniciativa com relevante importância, já que nas regiões do Interior do país, o envolvimento da população local é fundamental para experiências bem sucedidas e que valorizem os locais e tradições por onde passam.
O programa continuou então na Reserva da Faia Brava, gerida pelo parceiro ATNatureza, em que os participantes tiveram de aplicar todos os conhecimentos que foram apreendendo ao longo destes dias, com experiências práticas como guias de natureza, já em contexto real. Depois disso, ao final do dia, os participantes conheceram o local onde iam ficar alojados nesse último dia, a Casa da Cisterna, outro membro da rede de turismo. Durante o final de tarde, realizou-se ainda um encontro com os vários membros da Rede Côa Selvagem, que tiveram oportunidade de explicar aos participantes no que consistem as suas atividades e trocar conhecimentos importantes sobre o exercício da profissão.
Na quinta-feira, dia de encerramento do programa, existiram as últimas sessões individuais, em que os participantes deram o seu feedback da experiência e receberam também os comentários dos responsáveis sobre a sua prestação ao longo do treino, tendo depois sido agraciados com o diploma da atividade, que se espera ser o começo de uma longa ligação de cada um deles ao turismo de natureza e à promoção do património natural do Grande Vale do Côa e de outras zonas naturais do nosso país.
Daniel Veríssimo, da Rewilding Portugal, revelou-se satisfeito com os resultados obtidos e considerou que este é o primeiro passo de um longo caminho a percorrer. “Espero que este treino de guias de natureza seja o início de uma caminhada, que se espera ser uma maratona para os guias que foram iniciados agora e que seja uma bússola para os mais experientes que participaram também, como o José Almeida da DreamOverland ou o Samuel Ribeiro da Beir’aja. O turismo de natureza é uma pedra importante na economia baseada na natureza que se está a desenvolver no Grande Vale do Côa”, referiu.
O projeto LIFE WolFlux
Esta ação foi realizada no âmbito do projeto LIFE WolFlux, que visa promover as condições ecológicas e socioeconómicas necessárias para garantir a viabilidade da subpopulação de lobo ibérico a sul do rio Douro a longo prazo.
O projeto LIFE WolFlux está a ser coordenado pela Rewilding Portugal em parceria com a Universidade de Aveiro, Rewilding Europe, Zoo Logical e ATNatureza. É financiado pelo Programa LIFE da União Europeia e é co-financiado pelo Endangered Landscape Programme, que é gerido pela Cambridge Conservation Initiative e é financiado pela Arcadia, um fundo filantrópico de Peter Baldwin e Lisbet Rausing.