Hati, o cão de gado que nunca abandona a sua manada

Dezembro 3, 2021

O Hati, um dos cães integrados pelo projeto LIFE WolFlux para apoiar os produtores de gado da região e promover boas práticas de coexistência entre as comunidades locais e o lobo ibérico, viveu em Setembro uma história emocionante, em que mostrou que foi talhado para estas funções.

Créditos: Blue Nomads / Rewilding Europe

Uma aventura com um final feliz

O Hati, cão de proteção de gado da raça Serra da Estrela integrado pelo projeto LIFE WolFlux na Quinta do Tabalião, na Guarda, no ano de 2020, é o exemplo perfeito do papel importantíssimo que estes cães têm na segurança do gado e no seu acompanhamento fiel e dedicado em qualquer circunstância. Conta-nos o produtor que é agora seu dono,  que, numa madrugada em que chamaram pelo Hati e pela manada de Angus que possuem e não obtiveram resposta, se depararam, ao verificar o parque onde estas ficavam a pastorear, com “várias zonas da vedação periférica da quinta cortadas e as portaleiras fechadas no dia anterior completamente abertas”, não havendo qualquer sinal dos animais nem do seu protetor Hati.

Foi então que começaram a procurar pelas mesmas e que, “após uma longa caminhada à volta da quinta”, as encontraram no outro extremo da mesma deitadas junto à vedação que protege outra manada na Quinta do Tabalião. E quem estava com elas, sem nunca as ter abandonado? O jovem Hati, que sem comer e sem beber, nunca as deixou em nenhuma circunstância, tendo-as acompanhado em todo o caminho e assegurado a sua proteção. Este fiel companheiro manteve-se ao  lado da manada de Angus durante todo o incidente e garantiu que nada lhes acontecia até serem encontradas.

A importância da integração de cães de gado e a sua função protetora

Esta pequena história com final feliz ilustra a importância da integração de cães de proteção gado como é o caso do Hati. Os cães Serra da Estrela são uma das raças caninas mais antigas da Península Ibérica e protegem há vários séculos o gado a sul do Douro contra lobos ibéricos e cães vadios. Esta é, todavia, uma tradição que se está a perder, especialmente em territórios onde o lobo é avistado esporadicamente. Esta ligação umbilical dos cães, que são introduzidos muito jovens nos rebanhos e nas manadas para que as vejam como família e se sintam parte destes, com os animais que protegem é muito especial e é de facto uma missão que estes levam muito a sério.

Uma exploração com cães Serra da Estrela está mais eficazmente protegida de predadores, ainda mais no caso de um habitat rochoso e arbustivo, como aquele que caracteriza a região do Grande Vale do Côa. Os cães permanecem junto do gado, às vezes no meio do rebanho ou manada e outras vezes distanciados num local com boa visibilidade, prontos para entrar num estado de alerta quando detetam uma potencial ameaça para os animais.

O projeto LIFE WolFlux tem como objetivo aumentar a conectividade da subpopulação portuguesa de lobo-ibérico a sul do rio Douro, promovendo as condições socio ecológicas necessárias para melhorar o estado de conservação das alcateias existentes e para que os lobos juvenis se dispersem e se fixem em novos territórios. A integração de cães de proteção de gado tem um papel fundamental dificultando que o lobo cause prejuízos nos efetivos pecuários. Isto é importante do ponto de vista social, para mitigar impactos negativos na pecuária, e do ponto de vista ecológico, pois o lobo começa a depender menos de presas domésticas, alimentando-se de presas silvestres e realizando o seu papel de predador de topo no ecossistema. Para que isso seja possível, é preciso que exista diversidade e abundância de presas silvestres, que em Portugal são fundamentalmente o javali, o corço, o veado e a cabra montesa.

Espera-se que a integração de cães de proteção de gado continue a criar um exemplo positivo que possa ser seguido por outros criadores de gado da região, melhorando a coexistência com as comunidades locais. “Ao reduzir a predação dos lobos e assim promover a coexistência entre as pessoas e o lobo, estes cães estão a contribuir para a recuperação da espécie, aumentando a estabilidade, e a expansão territorial das alcateias já estabelecidas”, explica Sara Aliácar, Técnica de Conservação na Rewilding Portugal.

A Rewilding Portugal tem estado a integrar gratuitamente estes cães de gado a sul do rio Douro, assim como a garantir os seus gastos veterinários e de alimentação até atingirem um ano de idade. Para além disso, a educação do cão e a sua integração com as manadas e rebanhos é acompanhada para assegurar uma correta adaptação e aprendizagem das suas funções como cão de proteção de gado.

Créditos: Blue Nomads / Rewilding Europe
RICARDO FERREIRA

O projeto LIFE WolFlux

O projeto LIFE WolFlux é financiado pelo programa LIFE da União Europeia e co-financiado pelo Endangered Landscapes Programme. O projeto está a ser implementado por uma parceria de várias entidades, nomeadamente a Rewilding Portugal, Rewilding Europe, Associação Transumância e Natureza, Universidade de Aveiro e Zoo Logical.

 

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